os fabulosos peixes no aquário

fernanda araruna
3 min readMay 1, 2024

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os fabulosos peixes no aquário, 2024.

certo dia, joaquim e eu caminhávamos pelos corredores do zoológico quando avistamos um aquário. paramos diante aos peixes e ficamos imersos em um mundo submarino. debaixo d'água as nossas almas se parecem com as dos peixes. foi então que me veio pensamentos sobre primeira vez de tudo, quando tudo se resumia em ar & fogo, gostaria de ver a natureza de quando tudo começou pelo espanto e se descobriu ser. como se fez o aperceber sobre imagem linguagem embarcações mapas território fúria guerra explosão luto trégua tempo química amor toque desejo beijo cheiro língua suspiro vício carne aperto veias sangue ossos palavras olhares faíscas.

joaquim vez
ou outra descobre
assuntos que
o interessa
outro dia
assistiu sobre
navios naufragados

quando tudo se resumia a água & terra. gostaria de sentir o exato momento ao se descobrir sobre a vida & morte. escuridão água silêncio luz visão turva som abafado corte respiro choro batimento sede fome desespero pele fruto prazer gosto sacies sonho febre calor tremor esquecimento sono silêncio terra escuridão.

mesmo aqui, nas
correntes em
volta do recife
as mesmas regras
se aplicam as
presas e aos predadores

o que aconteceria se presenciasse o cenário da primeira vez? imagino que seria como sentir dor de cabeça ao perceber que o mundo era mundo e sentir vontade de beber toda a água que o corpo perdeu. enxergar o futuro, lidar com o depois e tremer de pânico ao saber que irá viver para sempre com o mesmo corpo. e, no fim, não saber devolver o mundo para o mundo.

qual foi o primeiro som a ressoar na terra? como teria sido a primeira reação ao ouvir a palavra água e vinho? da mesma forma que teria sido ao dizer a palavra fogo trigo e mastigar o pão?

e se, a partir do princípio no qual o espanto não nos impacta, jamais notaríamos nossa capacidade de mudar o que nos sucumbe. o que aconteceria se ainda vivêssemos no início, quando tudo o que se circulava era escuridão e ninguém ocupava o tempo do silêncio?

delineando palavras que escorrem como um rio, só então me dou conta de que os peixes não tinham consciência que passariam suas vidas inteiras dando voltas no aquário. isso seria cruel? fabuloso? para quem? penso sobre a salvação não como um alívio ou glória, mas como uma disposição. os bichos têm diferenças entre os outros, e a nossa seria a disposição para perceber. percebo que os homens passariam suas vidas inteiras circulando pela superfície. sendo assim, feitos de gestos trocas nomes verbos verdades omissões fragmentos. perceber que assim as coisas são e precisam ser. nem muito, nem pouco. este é o nosso caminho para salvação e divino.

o tempo tem
dessas de se
parecer velho
enquanto ainda
se pode ser novo

olhos fixos enquanto deslizam silenciosamente na água. o certo é o seu nado entre rochas e plantas. concluo, então, que a função da existência animal seria para nos apavorar horrorizar aterrorizar intimidar sobressaltar arriscar destroçar bestificar estarrecer.

qualquer sensação que seja pela primeira vez, formiga as costas. vive em mim a inquietação de saber do primeiro momento a partir do susto e do instante em que tivemos a consciência de que somos feitos de fogo, água, terra e de repente, sopro.

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